domingo, 11 de julho de 2010

Yuu

O mundo seria injusto com todos ? Talvez se você olhar para quem Yuu é, e o que o mundo deixou pra ele.

Yuu é um garoto pobre, fez 14 anos há alguns dias atrás, mas infelizmente, comemorou ele sozinho, pescando, como sempre, a comida do próximo dia. A expressão dele era a da tristeza... mas talvez a de não encontrar a felicidade. Quando Yuu tinha 9 anos, os seus pais vieram a falecer numa tempestade em alto-mar, ele não tinha ido pois teve que ficar cuidando da casa... mas parece que ficou para cuidar dela pra sempre, e Yuu não tinha nenhum outro parente. Yuu não tinha nada, Yuu não tinha ninguém.
Mas Yuu era um garoto de sorte, ele lia muito, sempre se infiltrava em pequenas bibliotecas e casas do vilarejo e roubava livros, de todos os mais variados assuntos... Medicina, Mecânica, Dramaturgia, Romance. Yuu lia muito. E ele aprendeu a ler do jeito que aprendeu a viver e está até hoje, sozinho. Além disso, Yuu também era muito bonito, na verdade, ele era provavelmente o garoto mais bonito do vilarejo, seu sorriso podia encantar qualquer pessoa ou animal.
Yuu era abençoadamente amaldiçoado.

Ele acordou, era domingo, dia de feira. Yuu não se interessava por comprar nada na feira, não tinha ambições assim. Mas ele gostava de observar as pessoas, e tinha a esperança de talvez encontrar alguém para tapar o buraco que sempre existiu nele. Yuu sempre tinha esperanças...
Voltando pra feira... Yuu estava caminhando distraído observando as pessoas ao lado comprando, sorrindo, negociando, discutindo... ele parou por alguns segundos para ver uma senhora reclamando irônicamente da qualidade de algumas maçãs, Yuu sentiu pena dela. Enquanto virava o rosto para continuar o caminho alguém bateu nele e os dois caíram no chão. Era uma garota que tinha vindo correndo e acertou ele, Yuu levantou e deu a mão pra ela. Ela devia ter a idade dele, era muito bonita.
Ela se desculpou e saiu correndo, Yuu olhou ela sumir da sua vista... fazia muito tempo desde que alguém tinha falado com ele. Por um instinto, não se sabe o que passou na cabeça de Yuu aquela hora, ele começou a seguir a garota em passos lentos...
Continuava o caminho, mas agora ele não observava mais as pessoas ao redor e sim procurava pela garota.

Por uma cruel coincidência do destino, aquela garota teve muita sorte que Yuu tivesse decidido ir atrás dela. Tolamente, Yuu não foi a única pessoa que ela esbarrou no caminho, as próximas ela não deu muita sorte. Eram 4 marginais do vilarejo, procurando briga ou pessoas para atormentar, e ela caiu diretamente na rede deles. Uma mosca indo pra teia de aranhas.
Eles levaram ela para um beco, onde começaram a mexer em sua mochila e implicavam com ela, o que parecia o líder, ou o mais forte. Tentava beijar ela, enquanto a empurrava e rasgava sua camisa.
Ela estava chorando muito, assustada. Quando ela ia gritar por socorro, uma sombra apareceu dando uma voadora no garoto que mexia com ela, ele rolou alguns metros e caiu quase desmaiado, foi um golpe muito forte. Todos surpresos olharam para quem tinha chegado.
Yuu estava com uma expressão sombria para os garotos, por ter vivido dependendo de si mesmo, Yuu tinha muita força no corpo, era muito ágil e detestava fortemente as pessoas que faziam injustiças. Ele não falou em nenhum momento, correu para os outros 3 garotos, deu um soco na barriga de um, um dos 3 socou o rosto de Yuu, fazendo ele virar e cuspir um pouco de sangue, mas Yuu girou e chutou a canela dele e deu uma joelhada na cara, o terceiro garoto caiu. O que sobrou ficou assustado e pegou um pedaço de pau para acertar Yuu. Ele quebrou o pedaço de pau em Yuu, sofrendo um golpe nas costas, olhou para o garoto com ódio e o derrubou com um soco.
Os 4 garotos correram com medo em seguida.

Yuu virou, machucado, cansado e sangrando, para a menina do lado. Ela ainda estava chorando e com os olhos tapados, ela estava com muito medo.
Ele cutucou ela levemente, e ela olhou pra ele. Yuu sorriu como se nada tivesse acontecido, e ela abraçou ele e começou a chorar. Yuu ficou assustado, não sabia o que fazer. Ele esperava que ela saísse como da outra vez.
- Obrigada - disse a garota a Yuu.
- D-de nada - respondeu.

A garota estava parando de chorar, e tentando se recompor, Yuu tirou seu casaco e deu pra ela. Pediu para ela subir nas costas dele, e perguntou onde ela morava. Ela apontou para um lugar não muito longe de onde estavam, e Yuu foi levar ela...
Nenhum dos dois falou no caminho, ela parecia estar muito cansada, e Yuu infelizmente não sabia o que falar. Estava acostumado a ficar com a boca fechada... sua barriga roncava, ele estava com fome. Chegaram na casa dela, era uma casa um pouco grande, mas nada muito incomum de toda a vila. Ela saiu de cima dele, e o convidou para entrar.
Yuu recusou.
- não seja bobo, vamos. você está machucado, temos que cuidar dele. - disse ela.
- eu estou bem, não foi nada. Só se cuide. - respondeu
- não! Volte aqui, você mancou quase todo o caminho e seu rosto estava mostrando que você está sentindo dor, temos que cuidar disso, agora.
- sou um estranho, não precisa se importar comigo. só fique bem.
- é um estranho que me salvou, e agora, eu vou cuidar de você - finalizou ela puxando ele pela mão, Yuu queria resistir e sair correndo, mas estava sem forças, e ele estava sentindo uma dor absurda nas costas.

A casa dela estava silenciosa, e ela abriu a porta com uma chave. Isso quer dizer que não tinha ninguém em casa, será que ela também não tinha pais como Yuu ? ele ficou recioso de perguntar e ignorou.
- meus pais viajam muito, quase sempre fico sozinha... então não se incomode. - disse ela em seguida, como se tivesse lido os pensamentos dele.
- err... posso fazer uma pergunta ? - disse Yuu timidamente.
- sim, claro. o que é ?
- Qual o seu nome ? - perguntou Yuu, curioso.
- Aya, e o seu ? - respondeu a menina, sorrindo.
- Yuu...
- Prazer em te conhecer, Yuu. Agora venha aqui, vamos primeiro cuidar do seu rosto.

Ela passou de leve uma pomada, Yuu sentiu ardendo, mas nada comparado ao que ele já passou por isso nem mesmo reagiu. Ela continuou limpando o machucado e aplicou um curativo.
- Tire a camisa, eles te machucaram nas costas, não foi ? - disse Aya.
- Não precisa, estou bem. - negou Yuu, porém foi por vergonha da menina ver ele sem camisa, do que pela dor que sentia.
- Anda, para de ser teimoso!
- Está bem... - respondeu cansado, sabendo que se insistisse não iria vencer.

Quando tirou a camisa, a expressão de Aya foi de susto. O corpo de Yuu estava cheio de cicatrizes, cortes e marcas. Parecia que ele havia sido surrado a vida toda, e o lugar onde Yuu foi acertado, estava muito roxo, ele deve ter quebrado uma costela.
Aya teve vontade de chorar aquela hora ao ver a cena, Yuu devia ter sentido uma dor infernal, mas carregou ela por 10 minutos na costa, sem reclamar uma vez. E ele nem sabia o nome dela, ele nunca havia falado com ela.
- Você... onde arrumou esses machucados ? - disse ela curiosamente triste.
- Com a vida. - respondeu Yuu caladamente, de olhos fechados e cabeça abaixada.
- Seu machucado... está muito feio, não posso cuidar dele. Temos que ir no doutor. Ele é meu tio, então não tem problema. Espere aqui, vou ligar pra ele.

Yuu queria ter recusado, mas não conseguiu falar. Continuo calado e parado, a dor era grande, mas ele já sentiu piores. Ele estava era com medo, essa foi a primeira pessoa que tratou ele gentilmente. Será que foi por que ele apenas protegeu ela ?
Será que se Yuu protege-se as pessoas, ela iriam gostar dele ? Seus pensamentos viajavam imaginando que talvez tivesse amigos, ou alguém que desse oi para ele quando o visse na rua. Yuu quase sorriu, quase...

- Meu tio vai chegar em alguns minutos, pedi para ele vir correndo que era caso de vida ou morte. Se bem que ele viria de qualquer jeito, tio estranho. - disse Aya rindo levemente.
- Yuu, você está com fome ? - perguntou ela.
- Não... obrigado. - negou Yuu, mesmo estando sem comer há mais de 1 dia.
O momento foi constrangedor, por que parece que pensar em comida, fez o seu estomâgo roncar mais alto do que planejava. Ele detestava ter se mostrado um mentiroso, mas não podia aceitar as gentilizas dela. Ele nem mesmo sabia como aceitar elas.
- Vamos comer, Yuu. - disse Aya, pegando ele pela mão novamente e puxando ele... ela era teimosa igual ele.

Aya preparava alguns sanduíches pra ele, e Yuu ficava olhando pra ela. Ele quase se esqueceu de piscar, Aya era linda. Cabelos até os ombros, em um castanho claro, era magra e esbelta. Aparentava ter a mesma idade que ele, e adorava sorrir. Yuu gostou tanto do sorriso dela.
- Aqui Yuu, seus sanduíches e sucos. - disse ela entregando um prato pra ele e sorrindo.
- Seu sorriso é lindo. - disse Yuu alto demais, quando reparou que falou seu pensamento, ficou tão envergonhado e vermelho que queria ter se escondido.
- O-Obrigada... - Aya ficou constrangida e feliz, virou levemente colocando os cabelos no rosto, mas sorrindo.

Eles começaram a lanchar em silêncio, Yuu por incrível que pareça, mesmo sendo pobre, era extremamente bem educado a mesa, deixando Aya muito confusa, pois pelas roupas, ela pensou que ele comeria como um esfomeado, igual os muitos garotos pobres da região que ela já viu. Mas aquele era diferente, ele era tão... encantador. Dessa vez foi Aya que se esqueceu de piscar, Yuu era mesmo bonito, estava um pouco sujo, mas seu rosto era firme. Tinha a idade dela, provavelmente, e parecia ter vivido dezenas de anos a mais. Ela só ficou um pouco triste, ela queria ver ele sorrindo de novo, pra dizer a mesma coisa pra ele.

- Yuu... quantos anos você tem ? - perguntou.
- 14... e você ? -
- 14 também. Onde você mora, Yuu ? -
Yuu hesitou por alguns segundos antes de responder.
- Perto da praia dos pescadores... - disse Yuu timidamente, com vergonha.
- Ah... mora com seus pais ? - perguntou Aya inocente.
- Não... -
- Ué, mora com quem ?
- Ninguém. - respondeu Yuu terminando de comer os sanduíches e bebendo o suco.

Aya ficou com medo de terminar de perguntar, então voltou para os sanduíches dela. Em seguida, a campainha tocou, o tio da Aya tinha chegado. Ela ficou feliz, finalmente alguém que soubesse do assunto poderia cuidar do garoto. Ele devia estar sofrendo muito, pensou. Ela saiu correndo para abrir a porta para seu tio.
- Tio Carlos! Finalmente. - disse ela agitada. Yuu tinha ficado encostado na porta da cozinha, observando ela abraçar o tio.
- Aya, minha querida!!! O que aconteceu, está bem ? Onde se machucou ? - dizia ele rapidamente, sua preocupação e carinho por ela eram óbvias. Yuu sorriu disfarçadamente, ficou feliz por a Aya ter alguém assim pra ela.
- Eu estou bem, tio. É o Yuu que está machucado, cuida dele!
- Yuu, quem ? - disse ele olhando ao redor, e vendo Yuu de longe. Ele nunca tinha visto aquele garoto. - Quem é ele, Aya ? - perguntou ele preocupado, o garoto parecia um pequeno marginalzinho de rua e pobre.
- O garoto que me salvou, anda logo, tio. - falou Aya empurrando o tio para a cozinha.
- Okay, okay! - sorriu Carlos enquanto ia ver o Yuu.

Yuu nunca tinha parado pra pensar antes nisso, mas descobriu naquele dia que ele era extremamente tímido. Ficou com vergonha e preocupado em deixar as pessoas cuidarem dele, não sabia como olhar ou melhor, como falar. Queria agradecer e sair, para que não perdessem tempo com ele. Mas sua voz não saia, a boca nem abria. Então novamente, ficou calado.
- Olá Yuu, meu nome é Carlos, sou o tio da Aya. - disse Carlos estendendo a mão para Yuu.
- Olá... - disse Yuu apertando a sua mão.
- Então, o que aconteceu ? - perguntou, olhando para o rosto machucado de Yuu. Aya então começou a explicar tudo que aconteceu, e falou que Yuu se machucou nas costas e estava feio. Ele olhou para Yuu com um grande interesse agora, parecia que estava a frente de um verdadeiro herói. Aquele que não queria os créditos pelos seus feitos.
- Yuu, tire sua camisa para eu ver.

Yuu obedeceu, e Carlos viu seu machucado. Parecia que não tinha quebrado nenhuma costela, mas o golpe foi bem forte, cuidou do machucado e fez alguns curativos. Ele ficou impressionado em como aquele garoto não reclamou da dor, aquilo devia estar doendo muito. Ele apenas ficou em silêncio.
- Bom, terminei. Yuu você tem que ficar de repouso por alguns dias para sarar, está bem ? - disse Carlos sorrindo para ele.
- Obrigado, doutor. Como posso te pagar por isso ? Infelizmente não tenho dinheiro, mas sou muito esforçado. - falou Yuu sinceramente.
- Me pagar ? Está louco ? Eu que estou em dívida com você, eu não sei o que faria se a Aya estivesse em perigo.
- Sim Yuu, não se preocupe com isso. - disse Aya, levemente irritada por Yuu se quer ter pensado em pagar algo. - Você tem é que dormir, sua casa fica longe e está ficando tarde. Que tal dormir aqui hoje ?
- É verdade Yuu, mas Aya, os pais dele devem estar preocupados. Seria bom Yuu ver eles. - disse Carlos. Yuu nunca pensou que reagiria a esse tipo de comentário, já que foi muitas vezes incomodado por ele. Mas aquilo machucou ele, Yuu queria poder voltar e ter alguém esperando ele. Mas a realidade não era assim. Ele decidiu que o melhor seria ir embora, acabar com aquele momento antes que ele ficasse viciado por ele.
- Não se preocupem comigo, eu vou agora. Muito obrigado por tudo, Senhor Carlos. E obrigado Aya. Por favor, fique bem. - disse Yuu educadamente se levantando e pegando a jaqueta.
- Espera Yuu! Você pode ficar aqui hoje. - disse ela andando rápido atrás de Yuu, o garoto era ágil. Mas ela segurou a mão dele a tempo. - Fique aqui hoje, você não precisa ir. Está machucado. - ela estava preocupada com ele.
- Obrigado, mas eu vou ficar bem. Por favor, se cuide. Até algum dia. - disse Yuu sorrindo, aquele sorriso desmoronou Aya fazendo ela sorrir ao mesmo tempo. Então ele virou, colocou a jaqueta e foi embora.

Ela encostou a porta e respirou, passou apenas algumas horas com aquele garoto, mas o achou tão extraordinária. Ela sabia que iria lembrar desse dia o resto da vida, e decidiu que amanhã iria atrás do Yuu. Ela precisava agradecer a ele direito.
- Venha Aya, é melhor você ir descansar também. Foi uma péssima experiência a de hoje. - disse seu tio levando ela ao quarto dela, para por a garota pra dormir.
Depois de algum tempo Carlos foi embora, e Aya ficou deitada na sua cama pensando na vida... e em Yuu.


Yuu finalmente chegou em casa. Estava tudo escuro, tudo quieto. Acendeu a luz, e caiu na cama. Soltou a respiração e deixou seu corpo cair. Estava tão cansado, foi o dia mais estranho da sua vida. Ele estava pensando na Aya, no Carlos, nos garotos, no seu machucado. Em tudo... estava pensando na Aya... a imagem dela voava gentilmente pela sua cabeça, e Yuu adormeceu rapidamente.